Recuperação Judicial no Campo dispara em meio a juros altos e crise do agronegócio
Recuperação Judicial no Campo dispara em meio a juros altos e crise do agronegócio
O ano de 2024 registrou o maior número de pedidos de recuperação judicial (RJ) da última década: foram 2.273 solicitações, um salto de 61,8% em relação ao ano anterior. No agronegócio, a situação foi ainda mais grave, com crescimento de 138% nos pedidos – passando de 534 para 1.272 casos, segundo levantamento da Serasa Experian.
A tendência é de agravamento, diante do aumento das tarifas impostas pelos Estados Unidos e da possível aprovação da taxação de 5% sobre as Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs), hoje isentas, que representam uma das principais fontes de financiamento do setor.
Desde 2020, após decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), produtores rurais pessoas físicas também podem recorrer ao mecanismo de reestruturação judicial. Só no primeiro semestre de 2025, foram 700 pedidos, quase o dobro do mesmo período de 2024 (320), representando alta de 45%, de acordo com o advogado Euclides Ribeiro Silva, especialista em recuperação judicial no campo. Para ele, os juros elevados são a principal causa do endividamento.
Apesar de fatores como alta no preço dos insumos, instabilidade climática e variações nas commodities, Silva aponta que o “custo do dinheiro” é o real entrave. “Com juros a 25% ao ano, nenhuma atividade sobrevive. A recuperação judicial virou a única saída para muitos”, afirmou, reforçando que o aumento nos pedidos derruba o estigma de que os produtores seriam maus pagadores.
O especialista critica ainda a falta de políticas de crédito mais consistentes, lembrando que o agronegócio representa quase 30% do PIB brasileiro. Segundo dados do Cepea/Esalq/USP em parceria com a CNA, a participação do setor deve chegar a 29,4% em 2025, ante 23,5% em 2024.
Para o advogado Eduardo Berbigier, o movimento de aumento das RJs se intensificou em 2023, após forte queda no preço das commodities e alta do dólar, que encareceu insumos importados. Ele exemplifica com a soja, cujo saco caiu de R$ 200 em 2022 para R$ 92 em 2025. Berbigier alerta que a expansão das recuperações judiciais traz riscos adicionais ao crédito, já que de R$ 12 bilhões em dívidas reestruturadas, R$ 3 bilhões vêm do agronegócio.
Desafios futuros
Especialistas alertam que o quadro pode se deteriorar com a tributação das LCAs e dos fundos de investimento, além do impacto do tarifaço dos EUA. Do total de US$ 40 bilhões afetados pelas medidas americanas, US$ 12 bilhões recaem sobre o agronegócio – e apenas 18% das isenções concedidas alcançam o setor.